Boca no Trombone
Resistir com armas e palavras
Massas judaicas, aproxima-se a hora. Deveis estar preparados para resistir. Nem um só judeu deve ir aos vagões. Os incapazes de oferecer resistência ativa, devem resistir passivamente, devem se esconder. Nosso lema deve ser: Todos prontos para morrer como seres humanos.
(Manifesto público da ZOB, a Organização Combatente Judaica do gueto de Varsóvia)
Todos os anos fazemos questão de lembrar o levante do gueto de Varsóvia, iniciado em 19 de abril de 1943, a primeira noite de Pessach daquele ano. Por quê ? Em que esta revolta se diferencia das demais ? Ritualizar a memória não empobrece seu conteúdo ?
Há muitas respostas. Embora várias rebeliões contra os nazistas tenham acontecido em campos de concentração na Europa, a do gueto de Varsóvia foi a que teve melhor nível de organização e, em consequência, a que maior resistência opôs à máquina de guerra hitlerista. A Organização Combatente Judaica foi exemplar na costura da unidade dos vários grupos políticos que conviviam na área do gueto. Seu comando, encabeçado por Mordechai Anilevitch, um jovem de 23 anos que havia escapado do gueto, mas voltara para comandar a resistência armada, sintetizava a pluralidade comunitária dos judeus poloneses. A liderança contava com representantes dos comunistas, socialistas e sionistas de várias tendências. Betar e o grupo ligado a Zeev Jabotinsky preferiram não aderir à revolta.
Não é irrelevante lembrar que as primeiras ações da ZOB foram contra a chamada polícia judaica. De acordo com o historiador Israel Gutman, sobrevivente do levante, “a ZOB estava convencida de que não se podia transformar o gueto numa força combatente se não fossem eliminados elementos da quinta coluna”.
Foi uma luta desigual, encarniçada, de final previsível. Apesar de inúmeros atos heróicos, os revoltosos terminaram dizimados pelos nazistas, que tinham enorme vantagem em homens e armas. O gueto acabou transformado numa pilha de escombros, mas a vontade dos insurgentes, “de morrer como seres humanos”, sobrevive como lição eterna. Oprimidos, humilhados e ofendidos têm o legítimo direito de resistir, com os meios que julgarem mais adequados, à violência que sofrem. Em abril de 1943, a luta armada foi não apenas um gesto de coragem, mas uma resposta, um grito, para a História.
Os povos criam, a cada momento, instrumentos variados de resistência. Não foi diferente em Varsóvia. Em outubro de 1941, o professor e intelectual de esquerda Emanuel Ringelblum foi para o gueto. Lá, formou a Oyneg Shabes, organização clandestina que teve entre 50 e 60 militantes, com um único objetivo: preservar a memória do que acontecia no gueto. Durante dois anos, esses guerrilheiros da História fizeram centenas de entrevistas, acumularam manuscritos e pesquisaram metodicamente o cotidiano do gueto. Ao perceberem o início das deportações, colocaram todo esse material em latões e os enterraram. Parte do material foi recuperada depois da guerra.
O que leva um homem, que tem a consciência de que dificilmente sobreviverá por muito tempo, a pensar no futuro ? Talvez se possa responder lembrando que, segundo uma longa e sofrida tradição judaica, o último ato de resistência consiste em dar testemunho, sobretudo para transmiti-lo às futuras gerações. Em certo sentido, a palavra demonstrou ser uma arma muito mais eficiente dos que os métodos de extermínio postos em prática pelos nazistas. Ao lado das armas, a palavra confinada em toscos latões ajudou a contar o que aconteceu no gueto de Varsóvia.
ZOB e Oyneg Shabes. Duas vertentes, um objetivo: reafirmar a esperança de que a barbárie não vencerá. Que o homem poderá viver sem ser humilhado ou explorado por seu semelhante.
ASA – Associação Scholem Aleichem de Cultura e Recreação (Rio de Janeiro)
CCMA – Centro Cultural Mordechai Anilevitch (Rio de Janeiro)
ADAF – Associação David Frischman (Niterói)
ICIB – Instituto Cultural Israelita Brasileiro (São Paulo)
Movimento Juvenil Hashomer Hatzair (São Paulo)
Meretz Brasil
ICUF – Federación de Entidades Culturales Judias (Argentina)
ACIZ – Asociación Cultural Israelita dr. Jaime Zhitlovsky (Uruguai)
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