Hotel de Saint-Aignan, sede do Museu de Arte e de História do judaismo em Paris.
Um povo sem história é um povo sem memória e, talvez, não haja melhor lugar para se conhecer os diferentes aspectos da história dos povos do que em um museu. Esta talvez seja uma das razões pelas quais a maioria das principais capitais do mundo e também pequenas cidades e povoados possuam, pelo menos, um museu judaico. Há também uma lenda, segundo a qual o patriarca Abrahão apascentava seus carneiros nas montanhas de Alepo. Daí o nome árabe Halab, que significa leite.
Objetos de arte e rituais, quadros, livros, roupas, utensílios domésticos, remanescentes de uma sinagoga e inúmeros outros objetos contam o dia-a-dia de comunidades que desapareceram no tempo. Revelam a herança judaica, com as tradições e diferenças entre os judeus de origem sefaradita e asquenazita, seculares e ortodoxos, enfim, falam de sua história. Em um artigo publicado na revista francesa "Passages", o jornalista André Goezu afirmou que a diversidade dos museus judaicos reflete a diversidade do judaísmo através dos séculos, além de também revelar a visão de seus idealizadores.
Museus de história, museus de artes plásticas, museus de arte religiosa, museus do Holocausto, museus de arqueologia. Museus, museus e mais museus, todos inspirados pela vida judaica, com suas tradições, seus rituais e cerimônias religiosas cujos símbolos despertaram a criatividade de artesãos e artistas através do tempo.
O resultado visto nas inúmeras salas de exposições de todo o mundo são criações que não podem ser analisadas simplesmente como se fossem ou não "obras de arte". Suas criações, acima de tudo, contam a história do povo judeu.
O museu de Praga
O Museu Judaico em Praga possui uma das maiores coleções de objetos rituais e religiosos - ou Judaica, como são tratadas estas coleções - de todo o mundo, cobrindo principalmente os séculos XVI a XIX. Seu acervo reflete a trajetória e o destino dos judeus da Boêmia e da Morávia, cuja presença na Checoslováquia vem desde o século X. Durante a Segunda Guerra Mundial, os judeus foram deportados para os campos de morte nazistas e suas coleções enviadas para Praga, onde foram cuidadosamente catalogados por curadores e historiadores de arte, também judeus, sob a supervisão dos alemães. Manuscritos raros, livros antigos em hebraico, rolos da Torá, ornamentos de prata, quadros e outros objetos foram gradativamente transferidos para os cofres nazistas.
Parte dessas coleções integra o atual acervo do Museu Judaico, permitindo aos visitantes conhecerem um pouco mais sobre as comunidades judaicas da região. Um manuscrito em hebraico, do século XIV, um livro em hebraico impresso em Praga em 1526, estão expostos ao lado de objetos de prata dos séculos XVIII e XIX, como castiçais, rimonim, chanuquiot.
O Museu Judaico de Praga possui, também, uma das maiores coleções do mundo de adornos em tecido, incluindo capas para chalot e matzot, sacolas para tefilin e talitim. Especialistas afirmam que o estilo destes ornamentos revela um intercâmbio entre os artistas judeus de Praga e de outros centros da Europa, seguindo certas tendências da época.
Estes mesmos especialistas afirmam ainda que o acervo deste museu, centrado principalmente em objetos religiosos, revela a importância da espiritualidade, dos simbolismos e da tradições para os judeus. A coleção de Judaica, como as pessoas que criaram os objetos e também as que os utilizavam, possui elementos que refletem a influência das comunidades vizinhas. São testemunhas silenciosas de um estilo de vida e das experiências de seus criadores.
O museu de Paris
O Museu de Arte e de História do Judaísmo localizado no antigo Hotel Saint-Aignan, em Paris, foi inaugurado em 1998 com um objetivo principal: a reconstituição das principais fases da história das comunidades judaicas da França, Europa em geral e África do Norte, mostrando os fundamentos da cultura e da vida religiosa através das tradições artísticas do mundo judaico.
Do ponto de vista histórico, o acervo apresenta suas diversas mostras organizadas cronologicamente, abordando as ondas migratórias, as perseguições, a Revolução Francesa e a Emancipação, o Caso Dreyfus e os eventos mais recentes do século XX envolvendo o povo judeu. São realizadas, também, exposições sobre a participação judaica no cotidiano nacional, sua organização social, costumes, folclores, língua e literatura.
O Museu possui, ainda, um espaço para coleções especiais, como a Isaac Strauss, que inclui objetos rituais oferecidos pelo barão Nathaniel de Rothschild às autoridades francesas, em 1860, e até então guardados no Museu Nacional da Idade Média. As coleções e objetos expostos no antigo Museu de Arte Judaica também foram transferidos para o Hotel Saint Aignan, incluindo pinturas do século XVIII e maquetes de sinagogas.
Há também coleções e exibições vindas de outros museus judaicos, como o Museu de Israel, em Jerusalém; Museu Judaico de Praga; Museu Judaico de Nova York, entre outros. O Museu de Arte Moderna do Centro Georges Pompidou, por exemplo, cedeu algumas obras criadas por artistas judeus do início do século XX, incluindo obras de Chagall e Lipchitz.
Desde sua inauguração, o Museu de Arte e História Judaica francês tem contado com o apoio de doadores, o que lhe tem permitido ampliar o seu acervo. Recentemente, os netos do capitão Dreyfus doaram todos os arquivos da família referentes ao avô.
O museu da Grécia
Cerca de 60 mil judeus viviam em Salônica, Grécia, no início do século XX. Atualmente, pouco mais de cinco mil estão distribuídos por todo o país. A maioria da população judaica foi vítima dos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial. Entre os que retornaram à Grécia, após o conflito, está Maurice Gattenio, que passou dois anos no campo de concentração de Bergen-Belsen e sobreviveu ao frio cobrindo-se com um cobertor feito de cabelos humanos.
Este é um dos objetos que compõem o acervo do novo Museu Judaico da Grécia, recentemente inaugurado, e que busca retratar um pouco da história da comunidade judaica do país. No dia da inauguração, Sam Benrubi, líder comunitário, fez a seguinte afirmação: "Este museu foi criado em homenagem aos 70 mil judeus que morreram e aos inúmeros gregos que ajudaram os demais a sobreviver".
O primeiro museu judaico foi criado em 1977, mas tornara-se insuficiente para guardar as memórias do passado. Assim, graças a doações, foi possível construir um novo no centro de Atenas marcando, também, as comemorações de dois mil anos de presença judaica na Grécia. O acervo contém antigas menorot, rolos de Torá muito raros, documentos sobre a deportação dos judeus gregos, trajes típicos tradicionais, objetos rituais e cortinas, entre outros.
O museu de Berlim
O Museu Judaico de Berlim foi projetado pelo arquiteto israelense Daniel Libeskind, filho de sobreviventes do Holocausto. Nascido na Polônia após a Segunda Guerra Mundial, criou um espaço artístico que, em suas próprias palavras, "evoca a extraordinária história da comunidade judaica berlinense, uma história viva que não é marcada apenas pela tragédia". Para ele, a história dos judeus alemães está profundamente ligada também ao passado barroco e à época do Iluminismo, na Alemanha.
Localizado na Lindenstrasse, o Museu abrirá suas portas somente em outubro do ano 2000, quando terá início uma série de exposições. A fachada do prédio, recoberto de zinco, foi idealizada em zigue-zague. No interior, espaços abertos criam uma sensação de vazio, assim explicado por Libeskind: "Apesar do desenvolvimento e da prosperidade dos judeus na Alemanha, o Holocausto provocou uma ruptura que jamais será esquecida. Os desníveis entre os diferentes pisos revelam esta quebra, que coexiste com um passado também glorioso".
No jardim, há 49 pilares preenchidos com terra alemã e há uma marcação especial no ano de 1948, marcando a criação do Estado de Israel. Este pilar foi um presente do governo israelense a Berlim.
Além de exposições sobre temas ligados à história dos judeus da Alemanha, haverá um local especial para artistas internacionais. Um dos nomes que já tem presença garantida no Museu de Berlim é Pablo Picasso. Isso porque o judeu alemão Heinz Berggruen, dono de uma das maiores coleções particulares de obras do artista e seu amigo, transferirá ao Museu parte de seu acervo.
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