A festa de Purim, celebrada no dia 14 do mês judaico de Adar, é a data mais feliz no calendário judaico. A Meguilat Esther, o Livro de Esther, conta a história de Purim.
Edição 102 - Dezembro de 2018
Resumindo os principais pontos que têm relevância em nossa discussão: um homem de nome Haman ascende ao poder como primeiro ministro do Rei Achashverosh da Pérsia.
Ele pede permissão ao monarca para aniquilar todo o Povo Judeu – que vivia sob domínio persa -, e o Rei aquiesce. A Rainha Esther, judia, esposa do rei, juntamente com seu tio Mordechai, frustra o plano de genocídio de Haman, conseguindo, ainda, que o Rei Achashverosh se vire contra ele. Haman planejara enforcar Mordechai e exterminar todo o nosso povo, mas, no final, são ele e seus dez filhos quem cai em desgraça e são enforcados.
A história de Purim – a ascensão de um inimigo dos judeus que tentava aniquilá-los – tem sido um tema recorrente na história de nosso povo. Como lemos na Hagadá de Pessach, “Em todas as gerações eles se levantam para aniquilar-nos. E D’us, Abençoado é Seu Nome, salva-nos de suas mãos”. É verdade que ao longo da história, o Povo Judeu enfrentou muitos Hamans. Contudo, nenhum deles personificou-o melhor do que Adolf Hitler. Podemos até conjeturar que ele foi a reencarnação de Haman, pois as semelhanças entre ambos – e entre a história de Purim e a “Solução Final ao Problema Judeu” da Alemanha nazista – são espantosas. Obviamente, há uma grande e dolorosa diferença: Haman não conseguiu implementar seu plano satânico, ao passo que, ainda que Hitler tenha, no fim, falhado, isso não se deu antes de assassinar sete milhões de judeus.
Uma ressalva importante: décadas atrás, acreditava-se que o número de judeus assassinados no Holocausto girava em torno de seis milhões – número aceito em 1946 durante os Julgamentos de Nuremberg. Nos últimos anos, novas evidências levaram historiadores e pesquisadores a concluir que o número de judeus mortos no Holocausto chega a quase sete milhões.
Nosso propósito, neste artigo, não é tentar explicar o Holocausto – está além de qualquer um de nós tentar explicar o inexplicável ou justificar o injustificável. Tampouco entraremos em discussões filosóficas ou teológicas sobre o Holocausto, pois, quando as pessoas o fazem, acabam insultando a memória dos sete milhões. Nosso propósito aqui é explorar as assombrosas semelhanças entre o plano genocida de Haman e a campanha nazista para exterminar o Povo Judeu.
Os filhos de Amalek
Muitos acreditam, erroneamente, que Haman e Hitler odiavam os judeus por serem alucinados ou porque acreditavam nas mentiras antissemitas que ambos fabricavam. A verdade é que Haman odiava o Povo Judeu porque ele pertencia ao povo de Amalek. No Livro Deuteronômio, a Torá diz o seguinte sobre Amalek:
“Lembra-te do que te fez Amalek em teu caminho de saída do Egito. Quando te encontrou no caminho e extirpou todos os que retardavam atrás de ti e tu estavas cansado e exausto e (Amalek) não temeu a D’us. Portanto, quando o Eterno, teu D’us, te der descanso de todos os teus inimigos em volta de ti, na terra que o Eterno, teu D’us, te está dando por herança para possuí-la, apagarás a memória de Amalek de debaixo dos céus, não te esqueças.” (Deuteronômio 25:17-19).
A Torá identifica o povo de Amalek como arqui-inimigo do Povo Judeu. Ainda que outros povos tivessem perseguido os judeus por diferentes razões – políticas, econômicas, religiosas ou territoriais –, o ódio de Amalek pelos Filhos de Israel é puro, despido de qualquer motivo ou justificativa. Amalek odeia os judeus simples e exclusivamente por serem judeus. Amalek e seus filhos não fazem distinção quando se trata de judeus: adultos e crianças, homens e mulheres, religiosos e seculares, capitalistas e socialistas, liberais e conservadores, sionistas ou não. Para Amalek, nós todos somos um só – um fenômeno indesejável que ele está determinado a extirpar da face da Terra. Assim como o mal naturalmente odeia o bem, também Amalek – personificação da maldade e da escuridão – odeia os Filhos de Israel, “uma luz entre as nações” (Isaías 49:6).
A Meguilat Esther revela que Haman era um agaguita. Agag, como nos ensina o Livro de Samuel, era o rei de Amalek. Haman e seus filhos – dez filhos e uma filha – eram amalequitas. Uma vez identificada a linhagem de Haman e de seus filhos, podemos facilmente identificar a origem de seu ódio obsessivo pelo Povo Judeu. Um ódio puro e sem fundamento aos judeus, cravado no DNA espiritual de Amalek e seus descendentes. Na história de Purim, Haman alega que deseja exterminar os judeus porque um de seus líderes, Mordechai, recusava-se a se curvar perante ele. Mas qualquer pessoa sensata percebe que se tratava de um pretexto ridículo. Se o poderoso primeiro ministro da Pérsia se sentia insultado por Mordechai, ele poderia tê-lo prendido – e, se fosse especialmente cruel, até podia executá-lo. Mas como justificar a morte de todo um povo, incluindo as crianças, porque ele se sentia insultado por um de seus líderes?
Haman não revela ao Rei Achashverosh o verdadeiro motivo por que deseja aniquilar todos os judeus. Em vez disso, espalha mentiras e falsas alegações que os antissemitas têm disseminado desde tempos imemoriais. Conta ao rei que os judeus têm suas próprias leis e, portanto, não podem ser servos leais a ele. Afirma, também, que eles não são confiáveis e representam uma ameaça a seu reino. Diz, também, que os judeus diferem de todos os outros povos: não se misturam, vivem segregados com os seus e, assim, não havia lugar para eles no reino de Achashverosh.
Sabemos que Haman é um amalequita porque o Tanach revela sua linhagem, mas mesmo se a Meguilat Esther não tivesse exposto essa ancestralidade, seria fácil identificá-lo como filho de Amalek. Vimos, pois, que se trata de um arqui-inimigo dos Filhos de Israel. Amalek é obcecado com os judeus. Vemos na história de Purim que o ódio de Haman por Mordechai e o Povo Judeu o consome. Todo o restante tem importância secundária para ele. Ele tinha tudo para ser um homem feliz: viera do nada e se tornara primeiro ministro de um vasto império. Conseguira, também, amealhar uma grande fortuna: a Meguilá conta que ele ofereceu grande soma em dinheiro ao rei em troca da permissão de aniquilar nosso povo. Além disso, ele tinha uma família grande – mulher, dez filhos e uma filha. Tinha tudo o que representa o sonho de muitos: poder extraordinário, influência, honra e sucesso, riqueza, mulher e muitos filhos. Ainda assim, Haman não desfrutava a vida enquanto houvesse judeus. Ele diz à mulher que nada lhe importava enquanto Mordechai estivesse vivo. Seu ódio pelos judeus estava arraigado no centro de sua vida.
Assim como Haman, Adolf Hitler também era obcecado pelos judeus. Como Haman, ele tentou justificar seu antissemitismo com mentiras e teorias absurdas nas quais nem ele acreditava. Como Haman, o ódio que Hitler tinham pelos judeus o consumia. Se não tivesse empregado tantos recursos para aniquilar milhões de judeus, teria tido maior chance de vencer a guerra. É possível que se Hitler tivesse podido escolher entre vencer a guerra ou matar todos os judeus, ele tivesse escolhido a segunda opção. Ele expressou seu ódio pelos judeus mesmo nos momentos finais de sua vida. Vejam como termina seu testamento: “Mas, antes de mais nada, conclamo a liderança da nação e aqueles que a seguem a observar as leis raciais mais atentamente, a lutar sem piedade contra os envenenadores de todos os povos do mundo, os judeus internacionais”. Foram essas as suas palavras finais. Poder-se-ia pensar que seu testamento concluísse com as palavras “Viva a Alemanha!”, ou “Viva o nazismo”, ou, ao menos, com uma maldição contra os exércitos que venceram e invadiram o país que ele conduzira e amara. Mas, em vez de amaldiçoar o socialismo, a União Soviética, os ingleses ou os americanos, ele dirige seu ódio contra os judeus, chamando-os de “envenenadores de todos os povos do mundo”, ainda que eles jamais o tivessem prejudicado. Ele odiava o Povo Judeu muito mais do que as nações que o haviam vencido, bem como a seu país, sua ideologia e tudo pelo que vivera, forçando-o a acabar com a própria vida. Como Haman, Hitler respirava antissemitismo.
E por que odiava tanto o Povo Judeu? Porque ele era filho de Amalek. Na verdade, ele era, provavelmente, seu filho mais bem-sucedido, pois, diferentemente de Haman, conseguiu implementar seu plano genocida contra o Povo Judeu. Felizmente não conseguiu exterminar-nos todos, como planejava, mas chegou perto disso.
Haman e Hitler
São vários os paralelos espantosos entre a vida de Haman e a de Hitler. Ambos vieram do nada e atingiram grande poder, tornando-se os líderes de facto de países poderosos. Hitler era um artista medíocre, sem um lar e um soldado raso de 2a linha na 1a Guerra Mundial. Nem era rico nem vinha de família nobre e nunca demonstrou grandes habilidades intelectuais. Como ele, também Haman serviu o exército, sem qualquer distinção. Antes disso trabalhara como barbeiro. Faltava aos dois a maioria das qualidades que lançam os homens a posições de poder, mas ambos eram mestres na manipulação e na mentira, e demagogos impiedosos e eloquentes.
Outra semelhança entre a história de vida de ambos foi o seu ódio pelos judeus, compartilhado por aqueles que lhes haviam dado o poder. Ao ler a Meguilat Esther, podemos perguntar: Como é possível que Haman tivesse convencido, tão facilmente, o Rei Achashverosh a lhe dar permissão de aniquilar os judeus? De fato, como alguém pode permitir o genocídio, em seu império, com tamanha leviandade? A resposta é que o rei da Pérsia podia ter sido crédulo e facilmente manipulável, mas no fundo também queria se livrar dos judeus. Achashverosh só mudou seu pensamento sobre o Povo Judeu quando se lembrou que Mordechai lhe havia salvo a vida e descobriu que sua amada Esther era judia. Mas, até que isso acontecesse, ele achou ótimo o plano de Haman de criar um mundo judenrein, livre de judeus. O Talmud (Bavli, Meguilá, 14a) revela que Haman viu no Rei Achashverosh um parceiro receptivo. Assim como os dois juntaram forças para exterminar os judeus, também o fizeram Hitler e o povo alemão. Nem todos os alemães eram nazistas e alguns se opuseram e até tentaram assassinar Hitler. Contudo, é fato histórico inquestionável que a Alemanha escolheu Hitler como seu líder, endossou suas ideias e, gradualmente, seus feitos. Pode-se dizer que os alemães lhe deram a mesma mensagem que o Rei Achashverosh transmitiu a Haman: “Faça com o povo (judeu) o que você achar melhor” (Meguilat Esther, 3:11).
É verdade que em julho de 1932, nas eleições, Paul von Hindenburg derrotou Hitler e permaneceu na presidência do país. Contudo, nessas mesmas eleições democráticas, os nazistas obtiveram mais assentos do que qualquer outro partido no Reichstag, o parlamento. Além disso, assim como havia feito Achashverosh, dando poder quase ilimitado a Haman, o presidente Paul von Hindenburg nomeou Hitler chefe do governo, em 30 de janeiro de 1933. É claro que Hitler usou de intimidação, violência e engodo, como o incêndio no Reichstag, para assumir o governo. Mas, se o seu Partido Nazista não tivesse sido o maior partido no Parlamento, ele jamais estaria em posição de o fazer. O povo da Alemanha e seu presidente foram diretamente responsáveis pela subida ao poder de Adolf Hitler e pelo Nazismo. Apesar do ódio de Hitler aos judeus e do que ele prometera fazer a eles, e apesar das atrocidades cometidas pelos nazistas, o povo da Alemanha estava bastante satisfeito com seu líder, enquanto as coisas estivessem indo bem no país. Assim como Haman não teria tido poderes para ameaçar os judeus sem a aquiescência e apoio de Achashverosh, também Hitler não poderia ter executado o Holocausto se o povo da Alemanha e seu presidente não lhe tivessem dado carta branca.
É importante observar que os judeus não são os únicos a ver paralelos entre a história de Purim e o Holocausto. Os nazistas também os viram. A história de Purim perturbava, tremendamente, Adolf Hitler. É possível que ele se tenha achado a personificação ou reencarnação de Haman. Em vez de tentar desacreditar a história de Purim, lançando dúvidas sobre sua veracidade, que é a maneira mais eficaz de tornar irrelevantes os fatos históricos, Hitler baniu e proibiu seu cumprimento. Na verdade, não foi apenas ele, mas seus “filhos” também ficaram profundamente perturbados com a história de Purim.
Em uma discurso proferido em 10 de novembro de 1938, dia seguinte à Kristallnacht, Julius Streicher – editor do jornal antissemita Der Stürmer, elemento central na máquina de propaganda nazista – fez a seguinte afirmação nefasta e mentirosa: assim como “os judeus haviam assassinado 75.000 persas (na história de Purim) em uma noite”, a mesma sorte ter-se-ia abatido sobre o povo alemão se os judeus tivessem conseguido iniciar uma guerra contra a Alemanha. Os “judeus teriam instituído um novo Purim na Alemanha”, alardeou.
Ataques nazistas contra os judeus eram frequentemente coordenados com as festas judaicas, especialmente Purim. Em Purim de 1942, dez judeus foram enforcados em Zduńska Wola, cidade na Polônia, para “vingar” o enforcamento dos dez filhos de Haman. Em incidente semelhante, em 1943, os nazistas fuzilaram dez judeus do gueto de Piotrków. Mas a conexão mais evidente feita pelo próprio Hitler entre ele e Haman foi um discurso que pronunciou em 30 de janeiro de 1944, quando declarou que se os nazistas fossem derrotados, os judeus celebrariam um “segundo Purim”.
Os dez Filhos de Haman e os Julgamentos de Nuremberg
Semelhanças realmente assombrosas entre a história de Purim e o Holocausto vieram à tona durante os Julgamentos de Nuremberg. A Meguilat Esther conta que os dez filhos de Haman foram enforcados. O Talmud revela que Haman também tinha uma filha, que cometeu suicídio e, assim, não precisou ser enforcada.
Dos 23 criminosos de guerra nazistas julgados em Nuremberg, 11 foram condenados à morte na forca. Duas horas antes da sentença ser executada, Herman Göring cometeu suicídio. O enforcamento dos dez nazistas foi realizado em 16 de outubro de 1946, que era o dia 21 do mês judaico de Tishrei – Hoshaná Rabá –, sétimo e último dia da festa de Sucot. Nossos Sábios ensinam que Hoshaná Rabá é o dia em que D’us julga as nações do mundo; é, também, quando Ele inicia os julgamentos selados por Ele em Yom Kipur.
Além do paralelo histórico entre os 11 filhos de Haman e os 11 nazistas sentenciados à morte – em ambos os casos, dez foram enforcados e um cometeu suicídio –, alguns estudiosos encontraram alusões aos Julgamentos de Nuremberg na própria Meguilat Esther. Lemos a seguinte passagem no Livro de Esther:
“O rei disse a Esther… ‘os judeus mataram e destruíram 500 homens e os dez filhos de Haman… Qual é, pois, a tua petição e esta se dará a ti!’ … Então Esther disse: ‘Se parecer bem ao rei, conceda-se aos judeus que se acham em Shushán, que também façam amanhã segundo o edito de hoje, e pendurem na forca os dez filhos de Haman’. Então o rei ordenou que assim fosse feito e publicou-se o edito em Shushán e penduraram os dez filhos de Haman” (Esther 9:12-14).
Quem lê essa passagem com atenção percebe que há nela algo muito enigmático. O rei informa a Esther que os dez filhos de Haman foram mortos e pergunta a ela se tem algum pedido adicional. Ela pede ao rei “...que também façam amanhã ..., e pendurem na forca os dez filhos de Haman”. Mas, se os dez filhos de Haman já estavam mortos, qual o propósito de enforcá-los “amanhã”? Explicam nossos Sábios: há um amanhã que é agora, e um amanhã que é depois. Em outras palavras, segundo nos ensinam eles, Esther pedia que o enforcamento dos dez filhos de Haman não fosse um episódio isolado na História, mas que também voltasse a ocorrer no futuro – “amanhã”. “O rei ordenou que assim fosse feito”, segundo nossos Sábios, refere-se não apenas a Achashverosh, mas ao verdadeiro Rei, Mestre do Universo.
O curioso sobre os Julgamentos de Nuremberg não é apenas o fato de dez nazistas terem sido executados – exato número de filhos de Haman também enforcados –, mas o método de execução também ter sido o mesmo. Como o julgamento foi conduzido por um tribunal militar, o método de execução deveria ter sido fuzilamento ou cadeira elétrica, como era costume nos Estados Unidos. No entanto, o tribunal insistiu, especificamente, em forca, exatamente como no apelo da Rainha Esther: “... amanhã ..., e pendurem na forca os dez filhos de Haman”.
Há quem possa ver com ceticismo esses paralelos entre a história de Purim e a “Solução Final ao Problema Judeu”, da Alemanha nazista. Mas um dos líderes nazistas, Julius Streicher, acima mencionado, não era uma dessas pessoas. Streicher foi enforcado ao amanhecer do dia 16 de outubro de 1946. Seu enforcamento foi o mais melodramático de todos. Joseph Kingsbury-Smith, único representante da mídia americana presente às execuções, fez uma matéria que foi publicada em todos os grandes jornais. A seguir, trechos da mesma:
“Julius Streicher fez sua entrada melodramática às 2:12h da madrugada…. Dois guardas, cada um segurando um de seus braços, conduziram-no ao cadafalso No 1, à esquerda da entrada. Ele caminhou, com firmeza, os seis pés de distância até o primeiro degrau de madeira, mas seu rosto se contorcia. Quando os guardas o detiveram antes dos degraus para as formalidades de identificação, ele bradou um grito pungente: ‘Heil, Hitler!’. O grito me causou um calafrio, coluna abaixo… Empurraram-no até os dois últimos degraus até o ponto mortal sob a corda do carrasco... Streicher foi balançado, subitamente, de modo a olhar para as testemunhas e as encarou. E, de repente, grita: ‘Purim Fest 1946! (Festa de Purim de 1946)’”.
Os estudiosos encontraram outra alusão aos Julgamentos de Nuremberg na Meguilat Esther. Ensinam nossos Sábios que, quando uma letra na Torá ou em qualquer dos demais livros do Tanach aparecem de tamanho maior ou menor, isso alude a algo muito significativo. Há uma tradição que conta que Mordechai, um profeta, escreveu a Meguilat Esther. No texto, encontramos três letras escritas com caracteres menores; elas são encontradas em meio ao nome dos dez filhos de Haman. Essas letras são um Taf pequeno em Parshandatha, um Shin pequeno em Parmashta e um Zayin pequeno em Vaizata. Durante milhares de anos, os judeus ficavam imaginando a razão para essas três letras terem sido escritas em tamanho menor. Agora, já o sabemos: as três letras misteriosamente escritas com letrinha pequena dentro dos nomes dos dez filhos de Haman, que foram enforcados, formam o ano do enforcamento dos dez nazistas. O ano de Taf Shin Zayin foi o ano judaico que representa outubro de 1946.
Um segundo Purim
Como mencionado acima, em 30 de janeiro de 1944, Adolf Hitler declarou que se os nazistas perdessem a guerra, os judeus celebrariam um segundo Purim. Os nazistas foram, efetivamente, derrotados; o Povo Judeu sobreviveu e seguiu em frente até reerguer o Judaísmo e fundar o Estado de Israel. Mas a derrota de Hitler não se configurou em um segundo Purim – pelo menos não um Purim festivo. Esse moderno Haman fracassou e morreu em desgraça, mas não sem antes assassinar quase sete milhões de judeus.
Não sabemos por que razão a salvação que celebramos em Purim não ocorreu quando Hitler subiu ao poder. No entanto, sabemos o seguinte: Haman e Hitler perseguiram os judeus porque nosso povo vivia na Diáspora. Hitler e seus carrascos foram capazes de liquidar milhões de judeus porque não tínhamos nossa terra – e nenhum país abriu seus braços para receber-nos e salvar-nos do extermínio. Hitler e seus carrascos torturaram e exterminaram dois terços do judaísmo europeu porque éramos vulneráveis e não tínhamos um exército judeu para nos proteger.
A festa de Purim celebra a maneira como a Divina Providência orquestrou uma série de eventos – milagres ocultos, a que chamamos de “coincidências” – para salvar o Povo Judeu das garras de Haman. E por que não houve tais milagres quando Hitler e seus “filhos” arquitetaram e executaram a Solução Final? Não o sabemos. Talvez o milagre tenha sido a derrota da Alemanha nazista. Qualquer estudioso da 2a Guerra Mundial sabe que as potências do Eixo poderiam facilmente ter saído vitoriosas não fossem os pequenos erros e cálculos malfeitos de Hitler.
O escritor inglês, Graham Greene, escreveu: “Você não consegue conceber, nem eu, a espantosa estranheza da misericórdia Divina”. Não podemos, de fato. Somos gratos à Divina Providência pelo fato de Hitler e a Alemanha nazista terem sido derrotados, e que seus dez “filhos” tenham sido enforcados e que o Povo Judeu tenha sobrevivido e que, apenas três anos após o fim da guerra, tenha podido realizar o sonho de 2.000 anos de criar o Estado Judeu na Terra de Israel. Mas não conseguimos entender o extermínio de sete milhões de pessoas. Talvez no Mundo Vindouro possamos entender a espantosa estranheza da misericórdia Divina; mas neste nosso mundo, várias coisas, como o Holocausto, escapam à nossa compreensão.
Nosso povo não pode permitir que a dor pelo Holocausto ofusque o júbilo de Purim. Contudo, talvez a morte de sete milhões de judeus deva nos fazer celebrar essa festividade com menos inocência do que as gerações anteriores ao Holocausto o fizeram. Através dos séculos, muitos judeus zombavam da figura de Haman, cujos planos malignos se voltaram contra ele próprio. Contudo, após voltar ao mundo na figura de Adolf Hitler, Haman deixou de ser uma figura da qual podemos zombar ou desconsiderar. Menachem Begin, Primeiro Ministro de Israel, que perdeu a maior parte de sua família em mãos dos nazistas, e que era um homem religioso mas também um guerreiro judeu orgulhoso e feroz, respondeu, em certa ocasião, à pergunta da lição que devemos tirar do Holocausto. Ele respondeu que o Holocausto deveria ensinar-nos que quando alguém promete matar todos os judeus, devemos levar essa pessoa muito a sério.
Um sábio conselho para todos nós, judeus, na Diáspora e em Israel. Amalek e seus descendentes podem migrar e passar por muitas metamorfoses – podem até ocultar-se nas sombras, durante longo tempo. Mas continuarão a existir até o dia em que o Mashiach chegar a nosso mundo. Mesmo nos dias de hoje, há homens como Haman e Hitler, e países como a Alemanha nazista, que prometem e tramam aniquilar o Estado Judeu e o Povo Judeu.
O Holocausto ensinou a nosso povo inúmeras lições muito dolorosas. Uma delas é que em um mundo que tolera e, por vezes, até consente na existência de homens como Haman e Hitler, os judeus têm que poder defender-se sem contar com ninguém. Podemos repetir “Nunca mais” tantas vezes quanto quisermos, mas não se trata de palavras mágicas que, de alguma maneira, impeçam um outro Holocausto. Somente a Divina Providência e um Estado de Israel forte, com sua feroz, implacável e afiada máquina de guerra, podem fazê-lo. Em nossa geração, os amalequitas são aqueles que se opõem à existência e legitimidade do Estado Judeu; eles querem destruir Israel por saberem que os judeus, sem um país e sem seu próprio exército, constituem presa fácil para os Hamans e Hitlers do mundo.
Purim é o dia mais feliz do ano judaico e deve ser comemorado como tal. Celebra a eternidade do Povo Judeu. Apesar do Holocausto – a perda de sete milhões de judeus, entre os quais um milhão e meio de crianças -, devemos celebrar essa festividade com grande alegria. Mas, devemos fazê-lo não apenas com um sorriso no rosto, mas também com uma férrea determinação em nosso coração de defender o Povo Judeu até que chegue o dia em que a memória de Amalek seja apagada de debaixo dos céus.
BIBLIOGRAFIA
Avraham, Rachel: Strange Parallels between the Purim Story and the Nuremberg Trials - United with Israel.
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