Prezado 1º Ministro. Sou cidadão israelense por opção desde 2009, ano em que o senhor foi eleito e proferiu um importante discurso no mês de junho, na Universidade Bar-Ilan. Confesso que fosse eu um ignorante, teria aplaudido mais da metade dos seus parágrafos. O senhor discorreu sobre a legitimidade do Estado de Israel, algo que conta com meu total apoio. Também convocou os líderes de Síria, Líbano, Arábia Saudita e da Autoridade Palestina às negociações por paz, voluntariando-se, inclusive, a visitar Damasco, Beirute e Riad caso fosse necessário. Também afirmou que já era hora de termos paz com nossos vizinhos, algo que me surpreendeu, pois o senhor já exerceu o cargo de 1º Ministro uma vez e não havia nem proposto algo do gênero. Também me identifico com a luta contra o terrorismo e a ameaça aos civis israelenses. Por outro lado, discordei de boa parte do que foi apontado pelo senhor, repetidos neste seu novo discurso, na mesma universidade, no dia seis de outubro deste ano.
Permita-me, senhor 1º Ministro, ignorar suas insinuações sobre o Irã. Eu não sou a favor da proliferação de armas nucleares, e, como cidadão israelense, também me preocupa o fato de o Irã possivelmente obter armas de destruição em massa, visto que é pública e notória a boa relação que a República Islâmica tem com os grupos Hamas e Hezbolah. Mas não me aterei a este ponto, pois não sou a favor de ofensivas militares, quanto mais em uma situação obscura como esta. O senhor certamente tem acesso a informações secretas da inteligência do exército israelense, não estamos igualmente informados. Por isso ignoro este tema.
Falaremos sobre os palestinos e a nossa situação bélica com eles. Senhor 1º Ministro, a sua leitura histórica sobre a origem do conflito muito se assemelha à minha. Se o senhor compreendesse português, te recomendaria ler meu texto “O ABC do Conflito”, para que observe como eu também sou bem informado, apesar de ter nascido no Brasil. Assim como o senhor, eu também creio que o conflito tem suas origens muito antes de 1967: o senhor aponta os Tumultos de Jaffa (Yaffo) de 1921 como a origem de tudo. Eu prefiro apontar o Tratado de Sykes-Pikot (1916) e a Declaração Balfour (1917) como seus pontos iniciais. Veja só: eu não culpo nem o sionismo nem os palestinos, prefiro apontar o imperialismo como produtor do conflito árabe-israelense. É certo que até então, judeus e árabes conviviam na Palestina Otomana em relativa paz, algo que me permite concluir que nós não somos inimigos por razões naturais: nem nós os odiamos nem eles nos odeiam por definição.
O senhor, no entanto, caro 1º Ministro, prefere culpar o outro lado por ter começado a briga. Me parece um argumento um pouco infantil, o senhor não acha? Eu, quando criança, também acusava meu irmão de ter começado a briga, assim como a recíproca é verdadeira. Meus pais, donos da sabedoria advinda junto à experiência, não se importavam com quem começou, mas sim com a resolução do conflito. O senhor também aponta a recusa árabe à proposta do Plano de Partilha da Palestina como justificativa para afirmar que os árabes “não quiseram a paz”. É verdade. Eles se recusaram a uma proposta que, aos olhos de hoje, pareceria extremamente generosa. Meu ponto, caro 1º Ministro, como historiador, é que não podemos analisar as questões fora de contextos. A liderança árabe errou em 1947, sem dúvidas. Mas não podemos, quase 66 anos depois, justificar a ausência do Estado Palestino por esta recusa. Até porque, e o senhor há de concordar, os palestinos perderam muito mais do que ganharam com esta guerra: ninguém que trabalha com qualquer perspectiva real de acordo ousa falar nas fronteiras de 1947. Até mesmo o presidente da Autoridade Palestina, Abu Mazen (Mahamoud Abbas) admitiu recentemente que aceitaria a hipótese de utilizar um visto de turista para entrar em sua cidade natal, Safed, na Galileia. Já é hora de olharmos para frente, não é mesmo, senhor 1º Ministro?
Quando o senhor afirma que “a ocupação e as colônias não são a raiz do conflito”, tem razão. Mas será que o senhor não pode admitir que hoje em dia ambos representem uma dificuldade para se chegar a um acordo, 1º Ministro? Será mesmo que o senhor acredite nas suas próprias palavras? Pode alguém, que admite que a criação de dois Estados seja a solução para a questão palestina, ignorar que 46 anos de ocupação e a contínua construção de colônias na Cisjordânia são nocivos para a paz? Peço perdão, senhor 1º Ministro, mas eu não acredito no senhor.
Obviamente o senhor não deixaria uma oportunidade como esta passar sem afirmar o que há de ser feito. O papel dos líderes, logicamente, é apontar caminhos, e o senhor não deixou de fazê-lo. O caminho apontado pelo senhor, 1º Ministro, foi claro: “não haverá paz enquanto os palestinos não reconhecerem a Israel como um Estado nacional judaico e renunciarem ao direito de retorno dos refugiados de 1948”. Pode ser que não o interesse, 1º Ministro, mas darei minha opinião: este foi o ponto mais problemático do seu discurso.
Sua proposta (ou seria ameaça) não contempla nenhuma solução, pois é unilateral, falsa e tendenciosa. Unilateral porque exige somente de um dos lados uma iniciativa. Baseio-me no argumento do escritor Amos Oz em seu livro “Contra o Fanatismo”, quando ele afirma que não haverá paz enquanto os dois lados não estiverem dispostos a renunciar. Se o senhor não mostrou estar disposto a nenhum sacrifício sequer, por que eles o fariam? O argumento é falso, pois o senhor em diversas ocasiões recusou-se a sequer considerar a criação de dois Estados com base nas fronteiras de 1967. Ora, senhor 1º Ministro, se o Estado Palestino não vier a existir nas fronteiras de 1967, onde seria? Mas o mais problemático é o quanto o senhor pode ser parcial e tendencioso: Israel jamais exigiu de nenhum outro Estado do mundo que o reconheça como Estado nacional judaico para que tenhamos paz e relações diplomáticas. Nem Egito, nem Jordânia, nem Turquia, nem Brasil, nem Argentina, nem França e nem Alemanha nos reconhecem como um Estado nacional judaico. Não seria uma humilhação exigir isto dos palestinos? Por que, senhor 1º Ministro, só aos palestinos, justamente os que habitavam estas terras antes de 1948, é exigido tal reconhecimento para que tenhamos paz? Perdoe-me senhor 1º Ministro, mas sua argumentação igualmente é discriminatória: há partidos árabes-israelenses que se recusam a reconhecer o caráter judaico do Estado de Israel, mas a Suprema Corte lhes dá o direito de existir. O mais problemático, senhor 1º Ministro, é o fato de o partido Yahadut HaTora, formado por judeus ultraortodoxos, não reconhecerem o Estado de Israel como um Estado nacional judaico e o senhor ter governado durante quatro anos com a sua participação na sua coalizão governista. Não te parece incoerente? A mim, 1º Ministro, me dá esta impressão.
Termino esta carta, senhor 1º Ministro, perguntando ao senhor: sua intenção de criar um Estado Palestino é séria e verdadeira? Eu gostaria que fosse. Não desejo culpar o sionismo nem o Estado de Israel pelo conflito unilateralmente, certamente há lideranças palestinas perversas que impedem que tenhamos paz. No entanto, caro 1º Ministro, eu não sou cidadão palestino. Não tenho o direito de eleger meu representante do outro lado, e estou certo de que nenhum deles me representa. O senhor foi eleito justamente para me representar, além de outros mais de oito milhões de israelenses. Por isso, senhor 1º Ministro, lhe peço que seja mais cuidadoso em seus discursos, e que passe a pensar em soluções reais ao invés de remoer o passado. Eu gostaria de ser liderado por um 1º Ministro comprometido com a paz. Posso confiar no senhor?
http://www.conexaoisrael.org/resposta-1o-ministro/2013-10-09/joao
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