Tenho nos últimos anos me preocupado em estudar as fontes diretas da Torah como forma de entender e me aprofundar melhor sobre as origens de nossas tradições, que foram modificadas profundamente nos últimos 1300 anos.
Para quem não sabe, a linhagem rabínica foi a maior reformadora do judaísmo de todos os tempos. Foi graças a ela que conseguimos sobreviver e adaptar o judaísmo no mundo, principalmente com a destruição do Segundo Templo, o exílio e a diáspora.
As consequências disso, porém, é que conhecemos hoje mais as leis rabínicas do que as próprias leis da Torah.
Se os profetas chegassem hoje, em nossos tempos, provavelmente não reconheceriam o que chamamos de judaísmo!
Sim, o judaísmo mudou e continua a mudar para poder se adaptar, sobreviver e dar respostas aos dilemas e às mudanças que vivenciamos em nossa saga de mais de 2000 anos de diáspora, até que acontecesse o verdadeiro milagre que foi a criação do Estado de Israel.
O problema é que, depois que Yosef Karo escreveu o Shulchan Aruch, no ano 1563 da Era Comum, nada mais pode ser escrito ou criado dentro do contexto judaico ortodoxo, fato que muitas vezes leva as leis rabínicas a muitas contradições, pois não é possível saber adaptar suas leis aos novos dilemas da atualidade!
Exemplo claro são, as leis da kashrut que são praticadas hoje na maioria do mundo judaico religioso estão desconectadas das mudanças que o mundo pós-moderno vem sofrendo. Com sua economia de mercado global altamente competitiva, a kashrut não oferece nenhuma importância à qualidade ecológica dos alimentos e nem se preocupa se os trabalhadores que produziram esses produtos receberam os seus direitos com dignidade.
A kashrut não faz nenhum controle ou avaliação da quantidade de produtos químicos e pesticidas que envenenam e intoxicam nossos alimentos, nem existe algum pensamento sobre as causas e danos profundos ao ecossistema e à saúde daqueles que consomem os produtos.
Como podemos dizer que frutas e legumes pulverizados com pesticidas podem ser considerados kasher ?
Como pode ser que não exista nenhum procedimento da kashrut para controlar o sofrimento de animais como as aves e as vacas que são criadas em confinamento?
Como podemos considerar a carne de gansos kasher, quando esses animais sofrem severas crueldades e são alimentados de forma violenta?
Como pode ser que os ovos das galinhas que comemos são kasher, se as galinhas produzem uma super produção de ovos graças à mutilação de seus sistemas sexuais?
Será que podemos chamar tudo que comemos hoje de kosher mehadrim ?
Dentro do que está escrito na Torah, é lógico que não!
A Torah nos obriga a observar o mandamento da não-crueldade com os animais e o respeito ao meio ambiente. A gravidade da ofensa pela crueldade animal não é diferente de comer carne de porco ou de misturar leite com carne!
Na verdade, o Talmud promulgou leis detalhadas para a preservação de animais há mais de 1300 anos, com base no conjunto de leis da Torah. Infelizmente, grande parte do mundo religioso esqueceu as verdadeiras fontes da Torah e da kashrut. As vistorias e supervisões se tornaram hoje um bom negócio, perfeitamente integrado ao mercado de consumo global sem escrúpulos e sem limites.
Vivemos uma realidade de muitos desastres ecologicos, e problemas sociais , portanto chegou o momento para refletir sobre esses temas e, quem sabe, mudar os paradigmas sobre o atual pensamento da kashrut, pois temos que começar a desenvolver um novo conceito: a kashrut social e ecológica com base no que está escrito na Torah.
A Torah nos ensina que somos obrigados a criar sistemas de kashrut baseados na justiça social e no respeito à natureza. Assim, devemos ter uma kashurt que seja voltada para os seus verdadeiros valores de respeito aos animais e às plantas, bem como aos direitos e à dignidade dos trabalhadores que produzem esses alimentos.
Vamos fazer renascer a Eco-Kosher como um padrão moral-econômico para as empresas e as indústrias, vamos consolidar os direitos de seus trabalhadores e vamos assegurar que nós seres humanos não possamos mais prejudicar o meio ambiente e trazer mais sofrimento aos animais.
Hoje, em Israel, como também no mundo judaico, existem várias comunidades e rabanim que veem a kashrut como uma boa oportunidade para aumentar a conscientização sobre questões do meio ambiente e da desigualdade social.
Acredito que se soubermos ampliar esse conceito de Eco Kosher em nossa vida judaica isso poderá nos ajudar e fornecer soluções práticas para resolver estes graves problemas.
Shabat Shalom!
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