Um novo partido laico, que conquistou a segunda maior bancada no Parlamento nas eleições de 22 de janeiro, desafia os privilégios do setor ultraortodoxo e exige que os estudantes dos seminários rabínicos prestem serviço militar como os outros cidadãos judeus de Israel. O partido Yesh Atid, liderado pelo ex-apresentador de TV Yair Lapid, tem como bandeira principal o que chama de "carga igual", exigindo que os ultraortodoxos arquem com as obrigações dos cidadãos da mesma forma que os laicos.

O Yesh Atid se opõe à isenção do serviço militar outorgada aos estudantes dos seminários rabínicos e aos amplos subsídios dados pelo governo a dezenas de milhares de ultraortodoxos que se dedicam aos estudos religiosos e não trabalham. Como condição para entrar na coalizão governamental liderada pelo primeiro ministro Binyamin Netanyahu, o novo partido, que obteve 19 (entre 120) cadeiras no Parlamento, exige a implementação do principio da "carga igual".

Já os partidos que representam quase 1 milhão de cidadãos ultraortodoxos – o Shas, com 11 cadeiras, e o Yahadut Hatorah, com 7 cadeiras – afirmam que, se tais propostas forem adotadas pelo governo, o resultado poderá ser uma "cisão do povo".

O porta-voz do partido Yahadut Hatorah, Yerach Tucker, disse ao Terra que "dezenas de milhares de estudantes dos seminários rabínicos estarão dispostos a ir para a prisão se forem obrigados a prestar o serviço militar". "Nós contribuímos para a sociedade estudando a Torá (texto sagrado do Judaismo), isso não é menos importante do que prestar o serviço militar", afirmou, "somos um Exército de estudiosos da Torá e assim contribuímos para preservar o povo de Israel".

Preceitos religiosos

"Seria inconcebível que nos obrigassem a abrir mão de nossa fé, de nossos costumes e de nossos preceitos", disse Tucker, para quem "o Exército não tem infraestrutura para absorver dezenas de milhares de jovens ultraortodoxos".

O fato de que no Exército servem homens e mulheres juntos seria um dos maiores problemas para os jovens ultraortodoxos, que foram educados em comunidades que adotam a separação entre os sexos. Outro problema seria o preceito da alimentação kasher (segundo os mandamentos da religião judaica) que os ultraortodoxos seguem. Embora a comida no Exército também seja kasher, várias correntes ultraortodoxas consideram que as regras adotadas pelas cozinhas militares não são rígidas o suficiente.

Segundo o partido Yahadut Hatorah, "ninguém tem o direito de determinar quantos estudantes irão estudar Torá".

Base jurídica

A base jurídica para a isenção dos jovens ultraortodoxos do serviço militar foi lançada em 1947, pelo fundador do Estado de Israel, David Ben Gurion. Com o objetivo de obter a legitimação de lideres ultraortodoxos para a fundação do Estado, Ben Gurion se comprometeu a liberar os estudantes dos seminários rabínicos do serviço militar.

Naquela época tratava-se de 400 estudantes. Hoje, o número de isentos ultraortodoxos chega a 60.000, causando um ressentimento entre os laicos, que aos 18 anos são obrigados a se alistar.

O ressentimento dos laicos também decorre do fato que grande parte dos homens ultraortodoxos não participam do mercado de trabalho e dedicam-se integralmente às atividades religiosas. Em muitas famílias ultraortodoxas são as mulheres que trabalham, para que seus maridos possam continuar estudando a Torá.

Subsídios

As instituições ultraortodoxas recebem subsídios do Estado, que também dá um extenso apoio através do ministério do Bem Estar Social, a famílias numerosas como no caso das famílias ultraortodoxas. "Eles (os ultraortodoxos) devem servir o Exército e trabalhar para se sustentar", disse o rabino reformista, Uri Regev, ao Terra.

Regev dirige a ONG Hiddush, que é contra a coerção religiosa e defende os princípios de igualdade e liberdade em todas as questões ligadas à religião. "Aos 18 anos todos devem se alistar e é o Exército que deverá decidir quantos irá recrutar", conta ele. "Aqueles que não prestarem serviço militar deverão prestar serviços nacionais e poderão trabalhar em hospitais, no corpo de bombeiros ou em qualquer outro serviço civil necessário".

No entanto, nem todos os laicos em Israel concordam com o lema da "carga igual". Para o colunista do jornal Ha'aretz, Gideon Levy, trata-se de um "slogan populista, para angariar votos, sem correr risco algum". Levy aponta outras questões, as quais considera mais importantes e urgentes do que a "carga igual", como o conflito com os palestinos, mas são bem mais controversas e espinhosas.

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