Postado por Jayme Fucs Bar em 31 de Agosto de 2009 às 8:00am
KAN EXPRESS
K.E. - Quem é Paulo Blank, segundo ele mesmo?
Bem, uma das versões possíveis é a seguinte. Uma pessoa que teve a sorte de pertencer a uma geração de gente muito curiosa e que certa vez encontrou uma frase de Carlos Drumond de Andrade que marcou a sua vida e o autorizou a prosseguir no caminho que ele ainda não sabia que vinha.
“As Coisas.
Como são tristes as coisas consideradas sem ênfase”,dizia o poeta..
Hoje, vivemos a era do aquário que transforma ênfase em coisa incômoda. Incomodar é o risco que temos que correr para não morrer de tédio neste aquário de águas paradas e cheias do medo da discordância. Todos devem ser bonzinhos, falar baixo e vender uma imagem que chamam de “espiritualizado”. Coisas do mundo New Age que também influenciam Israel, nome que uso no sentido de povo. Apaixonado pelo estudo do judaísmo e achando que ainda temos muito a conversar e dizer ao mundo, estou feliz com o convite que vocês me fizeram. Entrando nos 60 anos, torço para encontrar pessoas com quem a minha "ênfase" possa ser compartilhada. O Talmud ensina que são quatro as tarefas do vive: Estudar (lilmod,) Ensinar (lelamed), Cuidar (lishmor) e, finalmente, praticar (Laasot).
K.E. - Como vc. se tornou este intelectual sensível e profundo estudioso do pensamento judaico - aliás um ser em extinção por estas bandas?
Qualquer resposta a tua pergunta não passa de uma narrativa possível. Uma das que mais gosto é a seguinte: passando a minha adolescência em Israel, trabalhando desde os 17 anos com educação judaica, tendo uma mãe que me levava desde muito cedo aos eventos culturais judaicos e morando numa vila na Rua de Sant’Anna, onde eu entrava em casa e me descobria na Polônia falando Idish e tropeçando em história. Tendo no currículo afetivo cenas como a de Golda Meir apertando a minha mão de criança batendo palmas enquanto ela passava no meio de um monte de gente no cinema Odeon na Cinelândia. Um escritor de quem não recordo o nome disse que a infância é a pátria do homem. Estava coberto de razão.
K.E. - Como e de onde partiu o convite para participar e co-liderar o processo de criação da Comunidade do Judaísmo Humanista no Rio e o seu Beit Midrash?
Foi o Jayme Fuks a quem telefonei quando vi que tinha feito uma palestra sobre judaísmo humanista. Queria saber que coisa era aquela. Como não pude ir, pedi o telefone do conferencista a quem pensei que não conhecia e marcamos um encontro. Não me lembro de ter feito nada parecido na minha vida. Quando ele entrou na minha casa foi uma explosão de emoção. O homem na minha frente era o menino que eu conheci e a quem me afeiçoei quando trabalhava no Lar da Criança Israelita em 1972. Brincadeiras do destino que acabam em coisa séria. Ele já estava com o convite no bolso e como venho cultivando o habito do HINENI, eis-me aqui, respondi que sim. Para mim é o início do retorno ao meu começo de vida de moré Paulo em Olaria em 1966, coisa da qual tenho falado nos últimos anos.
K.E. - Imaginamos que suas expectativas e planos para o Beit Midrash da CJH-RJ,são muitas. Fale um pouco sobre elas
Prefiro dizer o que penso e esperar para ver os acontecimentos.
O filósofo Emanuel Levinas repete que o judaísmo não se resume aos sentimentos. Muitos se deliciam com o pensamento judaico como curiosidade, mas poucos o digerem e trazem para a vida. Como fazer pontes entre sentir, estudar e praticar sem limitar-se a um rito já estabelecido é um dos desafios deste movimento. "Beit Midrash" é casa da busca e da interpretação, teremos que buscar e construir juntos um espaço judaico chamado humanista. Na tradição judaica não existem respostas tranqüilizadoras e cheias de sentidos. Humanismo é uma palavra que nos dias de hoje os pensadores consideram superada. Lembra da palavra Rav que quer dizer muitos e não só rabino? Ou seja, da mesma forma que um rabino precisa ser muitos rabis, viver e buscar esta pluralidade humana talvez seja o sentido novo desta palavra antiga. Acho engraçado quando alguém diz que fulano é muito humano, confundindo humano, Humanista e bonzinho. Como se o mal não fosse humano. O título de um livro do meu mestre imaginário Emanuel Levinas, “Humanismo do Outro Homem”, pode ser uma boa pista. O outro é a chave. Li um artigo que saiu no jornal Haaretz, onde uma intelectual israelense diz que em Emanuel Levinas reside a única possibilidade para Israel definir-se na atualidade como estado judeu. Note bem, é como se ela dissesse: ou seremos judeus com Levinas ou não seremos judeus. O Jayme Fucs me encantou quando falou em multiculturalismo judaico. Creio que aí também mora uma pista importante.
K.E. - Oferecemos nosso espaço para que vc. Faça o seu convite pessoal a todo o público interessado a vir ao SHABAT DA CRIAÇÃO.
Primeiro a incidência na data. Não tínhamos reparado no 11/9. Buscávamos um Shabat antes do Rosh Hashaná e não percebemos quando escolhemos o dia em que aconteceu um momento extremamente traumático da historia contemporânea. Trauma é uma cena vivida que ficou congelada e que é preciso por em movimento. Descongelar. Como disse o Elias Salgado a respeito da data, uma boa oportunidade de liberar uma centelha de vida aprisionada e fazer um pequeno Tikun, um conserto, usando aqui a bela metáfora da cabala, a linguagem poética da tradição judaica. Talmud é razão, cabala é poesia. Segundo, começamos pelo prazer de usufruir a afetividade do encontro. Quando num Shabat cantamos e nos emocionamos, convocamos os sentimentos necessários para rejuntar o mundo partido. Os Terapeutas uma seita judaica de Alexandria no séc. II da era cristã, pensavam que através do coral de vozes de homens e mulheres cantando juntos, era possível reconstruir o andrógeno originário e consertar a unidade do mundo dividido em energias masculinas e femininas. Seria ótimo ter pessoas dispostas a tentar praticar o Bereshit uma vez mais.
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