Ao reverter a seta do tempo o perdão transforma relações. Desfaz as nódoas paralisadas da existência. Modifica o passado e transforma o futuro. Sem ele as emoções continuariam congeladas num eterno presente. A sua função é libertar quem sofre. Desviculá-lo daquele que lhe causou a dor. O perdão interessa a quem perdoa. Na civilização midiática ocidental, qualquer homem público diz e faz o que bem entende, mas, assim que tropeça em alguma falta, vai a público e pede desculpas. A expectativa do perdão garantido banaliza o gesto. Humanismo de crianças abandonadas, protegidas por alguma entidade tarnscedental sempre pronta a perdoá-las. Olhando do ângulo daquele que pede, o perdão só faria sentido se pudesse transformar a culpa em responsabilidade. Coisa discutivel.
Emanuel Levinas analisa o tratado Yoma, um estudo talmúdico sobre o tema do perdão: “Se um homem comete uma falta com relação a outro homem e o apazigua, Deus perdoará; mas se a falta se refere a Deus quem poderá interceder por ele a não ser o arrependimento e as boas ações”. O autor grifa o final da frase. O texto é claro. Em relação ao próximo, Deus não interfere. Em relação a Ele, também não. É a própria pessoa que se transforma em agente de seu perdão através da atitude que toma para com o outro. Nada de conversas facilitadoras. Sem perdão antecipado, o homem se percebe solitário em sua responsabilidade frente ao outro. A idéia dos “eles não sabem o que fazem” cai por terra. A Torá prefere a prática de uma responsabilidade que, não se restringe aos hebreus. Ela inclui, na mesma exigência, o estrangeiro que mora junto à porta daquele que sabe dos mandamentos. Uma religião para adultos, como repete Lévinas em várias ocasiões.
“Pode-se perdoar muitos alemães, mas alguns alemães são difíceis de perdoar. É difícil perdoar Heidegger... de liberá-lo de sua responsabilidade”. Embora considerasse Heidegguer o maior filósofo desde Platão,Emanuel L,evinas nunca abandonou esta opiniâo sobre o grande pensador. É na esteira de opiniões como estas que surgem perguntas Quando os representantes das comunidades judaicas brasileiras reagem tardiamente, e com muita discriçao para não chamar a atenção, às comparaçoes que fez Bolsonaro entre o nazismo e socialismo. Quando eles fingem esquecer as dezenas de milhares de judeus pertencentes ao BUND, o movimento operário judeu do leste europeu, aprisionados e mortos pelos alemães “socialistas”. Quando o embaixador de Israel corre para justificar Bolsonaro em seu proprio twitter, ele quer se opor ao Presidente Rivlin. A quem, teoricamente, representa. Rivlin havia declarado de maneira incisiva, que, nenhum interesse politico pode acobertar a violencia das afirmaçoes do presidente do Brasil. Refería-se a Netaniau. E também ao tema do esquecimento e do perdão que Bolsoando levantou diante dos seus aliados evangélicos.
Quando os descendentes de tantos assassinados se fazem de desentendidos, quem intercederá por eles no Dia do Perdão?